MPC-SP questiona investimento milionário de Instituto de Previdência em fundo imobiliário de luxo com baixa adesão do mercado
O Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, por meio de representação formulada pelo Procurador de Contas Dr. Rafael Neubern Demarchi Costa, titular da 1ª Procuradoria, requer o devido acompanhamento da aplicação de R$ 20 milhões realizada pelo Instituto de Previdência dos Servidores Municipais de São Roque em cotas do Fundo de Investimento Imobiliário (FII) Nest Eagle, voltado ao mercado de imóveis residenciais de luxo e superluxo.
Conforme apurado pelo MPC-SP, a aplicação do RPPS são-roquense foi feita diretamente na oferta primária do Fundo — modelo de investimento conhecido como IPO (sigla de Initial Public Offering) — e não por meio do mercado secundário.
“Ainda que atualmente seja juridicamente possível um RPPS adquirir cotas de FII em oferta primária, conforme atestado pelo Ministério da Previdência Social na Nota Técnica SEI 71/2024/MPS, diversas salvaguardas devem ser observadas, de modo a resguardar a segurança de seus investimentos”, alertou o Procurador de Contas ressaltando que a presente representação objetiva verificar se tais medidas preventivas foram adotadas pelo RPPS de São Roque antes de se comprometer com o investimento milionário.
Segundo o Estudo de Viabilidade apresentado no prospecto definitivo do referido Fundo, o investimento é totalmente voltado ao mercado de empreendimentos imobiliários residenciais que se enquadrem no segmento de alto-altíssimo padrão, os quais contam ainda com projetos de incorporação assinados por arquitetos de renome, e executados por empresas com expertise em empreendimentos de alto padrão.
No mesmo documento constou ainda uma expectativa de retorno elevada para os cotistas, com Taxa Interna de Retorno (TIR) entre 22,42% e “impressionantes” 58,30% ao ano.
Entretanto, apesar da projeção otimista, a resposta do mercado não foi favorável. Em sua oferta primária, encerrada em 17 de março de 2025, o Fundo captou apenas R$ 157,8 milhões dos R$ 500 milhões almejados. Importante destacar que cerca de 97,5% do montante investido procederam de aportes feitos por oito RPPS, incluindo o de São Roque, que sozinho contribuiu com quase 3,88% de sua carteira de investimentos.
“Ainda que esteja dentro do limite de 5% estabelecido pela Resolução CMN 4.963/2021, chama a atenção a concentração do investimento do RPPS de São Roque desta classe de ativos em um único FII, especialmente um FII em fase de IPO”, ponderou o Dr. Neubern salientando, inclusive, o pouco interesse do mercado pelo fundo em questão e sua baixa captação.
A representação ministerial também questionou a cronologia sobre o investimento na oferta primária do FII Nest Eagle. Após consultar as atas do próprio Comitê de Investimentos do RPPS de São Roque, verificou-se que a deliberação sobre o aporte de R$ 20 milhões foi realizada em julho de 2024, antes mesmo da versão final do regulamento do Fundo, disponibilizada somente em 16 de setembro. Da mesma forma, foi constatado em ata que o Instituto “estava comprometido com a aplicação”, já no dia seguinte ao anúncio de início do IPO e a publicação do prospecto definitivo em 18 de setembro.
Além disso, o cenário ficou ainda mais preocupante ao se considerar a manifestação de um dos membros do Comitê de Investimentos, registrada em 31/10/2024, que expressou desconforto com o risco da aplicação e perguntou se haveria possibilidade de desistência. Sobre o questionamento, o Gestor de Recursos teria concluído que não havia caminhos para uma possível reversão da operação.
“Tal cronologia, além de ser indicativa que as ressalvas e diligências necessárias para investir no IPO do referido FII não foram devidamente adotadas, também demonstra que o investimento encontrou resistências não ponderadas a contento antes da subscrição da oferta pública”, apontou o titular da 1ª Procuradoria do MPC-SP.
Em sua manifestação, o Procurador fez questão de mencionar a recomendação constante do parágrafo 89 da Nota Técnica SEI 71/2024/MPS: “É crucial que os gestores dos RPPS adotem uma abordagem criteriosa e contextualizada ao analisar as informações mínimas exigidas pela regulamentação ao considerar uma aplicação em FII, levando em consideração as características específicas de cada oferta e as necessidades do regime previdenciário.”
Diante dos fatos narrados, a representação do MPC-SP requereu ao TCESP que o Instituto de Previdência dos Servidores Municipais de São Roque apresente comprovação das diligências realizadas antes da subscrição do Fundo, incluindo o credenciamento da gestora e do distribuidor, bem como o atendimento aos requisitos da Portaria MTP 1.467/2022; que os membros do Comitê de Investimentos esclareçam os documentos que embasaram a decisão de aplicar R$ 20 milhões na oferta primária do FII Nest Eagle; e, por fim, que a equipe de Fiscalização do TCESP acompanhe a execução dos investimentos do RPPS de São Roque, conforme previsto na Ordem de Serviço SDG 01/2023.
Acesse AQUI a representação.