Publicação em
10/10/2025

Um número desproporcional de cargos comissionados, o pagamento de quase meio milhão de reais a membros de comissões e a devolução expressiva de recursos públicos motivaram a manifestação do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo pela reprovação das contas de 2024 da Câmara Municipal de São Sebastião.

O parecer, emitido pelo Procurador de Contas Dr. Rafael Neubern Demarchi Costa, destacou a ocorrência de falhas graves e reincidentes na gestão legislativa. Importante ressaltar que algumas das irregularidades apontadas vem se repetindo ao longo dos exercícios, comprometendo a transparência da Administração Pública.

Entre as impropriedades, está a superestimativa orçamentária evidenciada pela devolução de R$ 9.660.312,51, o equivalente a 27,6% do total repassado em duodécimos à Câmara sebastianense. Para o titular da 1ª Procuradoria de Contas, o valor expressivo demonstra que a previsão orçamentária, mais uma vez, não refletiu as necessidades reais de custeio e investimento da Casa de Leis.

A insistência em superestimar dotações, mesmo diante de alertas e recomendações já expedidas pelo Tribunal, configura conduta que compromete a credibilidade das demonstrações contábeis do Legislativo”, destacou Dr. Rafael Neubern.

A devolução de duodécimos em valores elevados é uma prática habitual em São Sebastião há quase uma década. “A alegação de que a devolução decorreu de medidas de economia e do cancelamento da desapropriação não afasta a irregularidade porque o excesso de devoluções de saldos orçamentários é recorrente desde 2015”, complementou.

Outro ponto que chamou a atenção foi o excesso de servidores comissionados. Os doze vereadores de São Sebastião mantiveram, em 2024, 85 cargos de livre nomeação, dos quais 66 eram comissionados e 19 funções gratificadas, representando 57,43% do quadro funcional. Entre eles, havia 36 assessores parlamentares e 12 chefes de gabinete, totalizando quatro assessores para cada vereador.

O excesso de comissionados compromete a legalidade, a eficiência e a moralidade da gestão pública”, ponderou o Procurador, frisando que a situação afronta o artigo 37 da Constituição Federal e o princípio da proporcionalidade fixado pelo Supremo Tribunal Federal no tema 1.010 de repercussão geral.

Ao se comparar os números de São Sebastião com os de outros 16 municípios de portes semelhantes, constatou-se a desproporção: com 12 vereadores e população inferior à média do grupo, a Câmara de São Sebastião teve despesa de R$ 24,7 milhões com pessoal e custeio, quase o dobro da média das Câmaras congêneres, estimada em R$ 12,8 milhões. O gasto per capita também foi mais de 100% superior à média— R$ 294,59 por habitante, contra R$ 144,70 nos demais municípios.

O parecer também destacou o pagamento de R$ 494.491,04 a 53 servidores que integravam 11 comissões permanentes, com baixo volume de atividades comprovadas e funções sobrepostas às rotinas normais dos cargos efetivos. Segundo a defesa, ‘tais pagamentos têm respaldo na autonomia municipal e foram feitos em conformidade com a legislação local’. 

Sobre o tema, o representante ministerial fez questão de esclarecer que “a previsão em lei local não basta para legitimar gastos que afrontam os princípios da eficiência e da economicidade, pois a Constituição Federal impõe que todo dispêndio público esteja condicionado à real necessidade e à demonstração da vantagem para a coletividade”. E continuou: “A falta de comprovação concreta da efetiva atuação das comissões e a sobreposição de tarefas configuram impropriedade, não sendo possível reconhecer a regularidade dos pagamentos apenas com base na presunção de legalidade formal da norma municipal”.

Outro fator desabonador foi a realização habitual e desarrazoada de horas extras, contrariando a própria legislação local. Segundo apurado pela auditoria do TCESP, houve casos de servidores que realizaram de três a cinco horas extraordinárias por dia em determinados meses, descaracterizando o caráter excepcional da medida.

O caráter excepcional do labor além da jornada regular exige que sua utilização ocorra com absoluta moderação, precedida de justificativas objetivas e claras, e jamais se converta em prática reiterada ou substitutiva da força de trabalho regular”, lembrou a manifestação.

Para completar o rol de irregularidades, também foram identificadas inconsistências nas despesas gerais e nos adiantamentos, falhas já observadas em exercícios anteriores. “Tendo em vista a desorganização dessas despesas e evidências de fragilidades da gestão, tais desajustes estão em descompasso com os princípios da eficiência, transparência e interesse público, suficientes para ensejar a reprovação dos demonstrativos”, concluiu Dr. Neubern.

Acesse AQUI o parecer.