MP de Contas quer que Educação explique possíveis irregularidades e direcionamento em chamamento público
O Ministério Público de Contas de São Paulo, por intermédio de sua 5ª Procuradoria, representou ao Tribunal de Contas contra o Chamamento Público nº 03 /2020 realizado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo com o objetivo de receber doação de aplicativos e plataformas para uso pela pasta.
O Procurador de Contas Dr. Rafael Antônio Baldo, responsável pela petição, promoveu a análise processual tanto sob os aspectos objetivos quanto sob os aspectos subjetivos. A partir de ambas perspectivas, Dr. Baldo pleiteia que, após o término da instrução, a Secretaria seja notificada para que possa apresentar as justificativas que entender cabíveis.
É preciso ressaltar que em tempos de pandemia, a Secretaria Estadual da Educação buscou uma solução tecnológica temporária, capaz de permitir aos alunos assistirem às aulas através de aplicativo destinado a dispositivos móveis. Para tal, a pasta realizou um chamamento com prazo de apenas 6 horas para a inscrição de interessados em fazer a doação de aplicativos e plataformas, licenciamento de software e acesso ao banco de dados. Com a adesão fracassada, o Governo prorrogou por mais 6 horas o prazo para apresentação de propostas e assim, tendo a empresa “IP.TV Ltda.” como única interessada, esta sagrou-se vencedora e doadora de tecnologia estimada em R$ 3 milhões. .
Sob os aspectos objetivos, o MP de Contas destacou que houve uma descrição genérica do objeto, onde não ficou claro o real objetivo do Chamamento Público, o que desatendeu ao princípio da transparência causando grave prejuízo à publicidade do procedimento. Outra questão levantada pelo Procurador de Contas diz respeito à ausência de alguns requisitos necessários à caracterização de uma doação: não há transferência definitiva do domínio com diminuição do patrimônio do doador (elemento objetivo da doação) e também não há contrato verdadeiramente gratuito (como a doação requer), pois o objeto em exame trouxe vantagens tanto para a Administração donatária, quanto para a empresa doadora. Além disso, ainda persiste “a discussão a respeito da natureza jurídica do licenciamento de softwares, se ele seria um direito, um bem ou um serviço, principalmente para fins tributários. Se o licenciamento de softwares for qualificado como um direito imaterial, então a relação firmada entre a SEDUC e a empresa IP.TV seria uma cessão de direitos e não um contrato propriamente dito”.
Quantos aos aspectos subjetivos, o parecer ministerial levou em consideração o capital social da empresa vencedora, a localização da sede, a composição societária e o histórico de seus acionistas. Além do capital social de apenas R$ 10 mil, também chamaram a atenção do MPC-SP a localidade e a fachada modestas da sede da IP.TV, que não condizem com o esperado para uma empresa de alta tecnologia, capaz de fornecer uma solução tecnológica avaliada em R$ 3 milhões.
O quadro societário da empresa vencedora é um capítulo à parte na manifestação do Órgão Ministerial. A IP.TV Ltda. tem como sócia majoritária a “CSETE Consultoria Empreendimentos e Participações Ltda.” Essa última, também é sócia da empresa VAT Tecnologia da Informação S/A” que celebrou um contrato de R$ 19,8 milhões com a SEDUC do Amazonas e outro contrato de R$ 10,6 milhões por ano com a Universidade Estadual do Amazonas, enquanto o Sr. Rossieli Soares (atual Secretário da Educação do Estado de São Paulo) ainda era Secretário de Educação naquele estado. Outro apontamento vem de reportagem do portal de notícias “The Intercept Brasil”, onde o Sr. Cláudio Dutra, um dos sócios da CSETE, teria vínculos com o administrador da ‘Rádio Mix’ de Manaus que divulgava o aplicativo “Mano.ip.tv” criado pela IP.TV para transmitir conteúdo interativo via streaming e canais ao vivo, dentre eles a “TV Bolsonaro”. A CSETE ainda teria conexões com o Sr. Waldery Areosa Ferreira Junior, investigado pela ‘Operação Estocolmo' por possível esquema de exploração sexual infantil no Amazonas.
Sobre esta notícia, o Ministério Público de Contas alerta para o caso da empresa IP.TV ter acesso a dados pessoais de seus usuários, ao microfone do celular e a trocas de mensagens em grupos de bate -papo como informado pelo “The Intercept Brasil ”. “A situação se mostra preocupante, pois o acesso aos dados pessoais dos alunos poderia facilitar a disseminação daquelas mesmas práticas investigadas na Operação Estocolmo”, finalizou Dr. Rafael Baldo.
Acesse AQUI a representação na íntegra.