Procuradora afirma que Prefeitura do litoral paulista não entrega serviços públicos de qualidade à população
A constatação de superávit financeiro, o cumprimento do valor mínimo constitucional de investimento na educação, e a destinação do dobro de recursos previstos à área da saúde, não garantem o bom desempenho de uma Administração Pública, tampouco a emissão de parecer favorável às contas do gestor.
Tal entendimento foi demonstrado pela Procuradora de Contas Dra. Élida Graziane Pinto em sua sustentação oral sobre as Contas Anuais de 2023 da Prefeitura Municipal de Ubatuba, cujo processo constou da pauta de julgamentos da Segunda Câmara do TCESP realizada no dia 15 de abril.
“É importante lembrar que a Lei de Responsabilidade Fiscal pede tanto a gestão da receita quanto a adequada aplicação da despesa. E a cidade de Ubatuba, efetivamente, não entrega serviços públicos de qualidade à sua sociedade”, afirmou a Procuradora.
A despeito da Prefeitura ter aplicado o dobro do piso em saúde, duas Unidades Básicas de Saúde (UBS) não conseguiram solucionar nem metade dos problemas apontados pela inspeção, no período de 2023, conforme informações trazidas nos relatórios dos auditores da Corte de Contas paulista.
“O município, que aporta 35% da receita de impostos, não atender sequer ao apontamento das unidades básicas de saúde é algo que causa estranheza, afinal não foi por falta de aplicação de recursos”, pontuou.
A titular da 2ª Procuradoria do MPC-SP inclusive relacionou a possibilidade de Ubatuba precisar empregar mais recursos em saúde devido ao baixo investimento realizado em políticas públicas ambientais. Apenas 54% dos apontamentos fiscalizatórios sobre o tema “resíduos sólidos” foram resolvidos no exercício examinado.
“O município tem esgoto a céu aberto e um patamar de tratamento de água e esgoto inferior, não só a menos da metade da média do Estado de São Paulo, mas inferior à sua própria região. Esse índice traz uma demanda maior na área da saúde, pois se o problema de saneamento básico fosse enfrentado de fato, não precisaria aportar 35% da receita de impostos em saúde. Não é bonito gastar tanto em saúde”, enfatizou.
Para ela, o cenário mostra um gargalo estrutural em razão da ausência de medidas preventivas e saneadoras para aliviar o setor de saúde, resultando na má alocação do recurso municipal que trata tão somente da ‘doença’ já instalada.
A Procuradora também fez questão de destacar que, durante o exercício de 2023, foram arrecadados cerca de R$ 18 milhões a título de taxa de preservação ambiental. Entretanto, ainda que seja notório o fato de que se trata de uma região com recorrência de desastres naturais, não houve qualquer dotação orçamentária direcionada à melhoria na estruturação da Defesa Civil, bem como à gestão de riscos de eventos catastróficos como alagamentos e deslizamentos em áreas de encostas.
“Há um caos relativo à Defesa Civil porque a Prefeitura de Ubatuba não estrutura devidamente o órgão, dando causa à contratação de horas extras. A Defesa Civil tem que realizar operações durante a madrugada e em finais de semana, exatamente porque é histórico o enfrentamento a desastres naturais nesse município”, completou.
Contestou-se, da mesma forma, a falta de cobrança de dívida ativa por parte do Executivo, que resultou na prescrição de mais de R$ 23 milhões em recursos que deixaram de compor o erário municipal.
“Ubatuba é altamente dependente de royalties, e não é bonito entesourar recursos a título de superávit financeiro, abrindo mão de arrecadar receita de impostos, tendo-se um patamar de tratamento de esgoto inferior à metade do patamar estadual e da própria região. E ainda, é preciso lembrar que royalties oscilam, e o valor do barril de petróleo está caindo”, alertou Dra. Graziane.
Por fim, a representante ministerial também criticou a existência de demanda reprimida de 545 vagas em creche, o entesouramento de mais de R$ 8 milhões de recursos da educação, além do número excessivo de docentes autônomos (RPA) compondo o quadro de pessoal das escolas municipais de Ubatuba, em flagrante desobediência à Estratégia 18.1 do Plano Nacional de Educação (PNE) que estabelece que 90% do quadro de profissionais do magistério seja efetivo.
“Reiteramos aqui o pleito pela emissão de parecer desfavorável às contas anuais de 2023 da Prefeitura Municipal de Ubatuba, dado o somatório da avaliação da receita, dos resultados da despesa e dessa estrutura precária de gestão de pessoas”, concluiu a Procuradora ao frisar que “o problema não está na falta de recursos, mas em não querer usar o recurso disponível”.
Assista ao vídeo: